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AÇÃO PROPOSITIVA DA OUVIDORIA DA POLÍCIA
1996 A 1998
Em três anos de funcionamento, a Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo ouviu mais de 20 mil pessoas. Encaminhou e acompanhou milhares de denúncias, queixas e reclamações junto à Polícia Civil e Militar, tornando-se porta voz da população neste setor do Estado. Este intercâmbio permanente com a sociedade permitiu que o órgão tivesse um amplo diagnóstico das irregularidades pontuais e estruturais das Polícias, até porque, dentre as pessoas que procuraram o serviço da Ouvidoria incluem-se milhares de policiais que também viram no órgão um espaço institucional para encaminhar suas reclamações.
Desde o início, entendíamos que caberia também à Ouvidoria da Polícia propor medidas que visassem o aperfeiçoamento dos serviços prestados à população pela Polícia Civil e Militar e outros órgãos da Pasta. Por esta razão, os Relatórios Trimestrais e Anuais de Prestação de Contas publicados pela Ouvidoria além de trazerem dados estatísticos das denúncias encaminhadas e resumo dos casos prioritários relacionados à violação da integridade física dos cidadãos, sempre apresentaram um espaço para o que chamamos de Ação Propositiva da Ouvidoria da Polícia.
Um órgão de fiscalização autônomo e independente da atividade policial tem o dever de mostrar ao Governo e, em particular, à sociedade que, além de encaminhar denúncias e acompanhá-las com rigor, também prioriza propor alternativas que visem, a curto e médio prazo, diminuir os atos irregulares e as deficiências estruturais que a Ouvidoria torna públicos.
É nessa perspectiva que elencamos, neste Relatório Anual, as principais propostas feitas pela Ouvidoria em 1996 1997 e 1998. São mais de 40 propostas que nasceram da reflexão no Conselho Consultivo da Ouvidoria e, fundamentalmente, do que aprendemos com a população e com o convívio com setores idealistas e vocacionados das duas Polícias que, como nós, acreditam na construção de uma Polícia cidadã.
Se, em 1996, fizemos propostas por entendermos que era parte do trabalho da Ouvidoria, em 1997 e 1998 o fizemos também para cumprir uma atribuição legal prevista na Lei Complementar 826/97, que institucionalizou a Ouvidoria da Polícia.
O Governo do Estado pode considerar as propostas ou não. Várias foram aceitas e concretizadas. Sua natureza essencial está no campo das sugestões ou recomendações. O fato é que elas, as propostas, espelham nosso acumulo de trabalho e refletem nosso compromisso com a melhoria da atividade policial legalista, transparente e democrática.
PROPOSTAS DE 1996
I. Polícia Civil
Reestruturação e ampliação do DENARC (Departamento Estadual de Narcóticos) e reformulação do Decreto nº 34.214/91 (artigos 4º e 5º) no sentido de que as DISES (Delegacias de Polícia de Investigação Sobre Entorpecentes) sejam subordinadas, no aspecto normativo e operacional, à Diretoria do DENARC, visando a unificação da ação da Polícia no combate ao narcotráfico no Estado de São Paulo. Sugerimos também maior intercâmbio com organismos internacionais especializados no combate ao narcotráfico e programas conjuntos com a Polícia Federal.
Competência Estadual para a Corregedoria da Polícia Civil - reformulação do Decreto nº 30.413/89 (artigo 19, inciso I) no sentido de que a Corregedoria tenha competência de atuação em todo o Estado de São Paulo, criando divisões no DEMACRO e DEINTER, subordinadas, no aspecto normativo e operacional, à Corregedoria da Polícia Civil. Isto representará o fortalecimento do órgão apurador e facilitará o monitoramento dos casos acompanhados pela Ouvidoria da Polícia (em agosto de 1997, o Excelentíssimo Senhor Delegado Geral de Polícia entregou ao Excelentíssimo senhor Secretário de Segurança Pública minuta de Decreto pertinente à referida alteração na competência).
3. Questão Carcerária
3.1 Separação entre os presos condenados e os presos provisórios.
Proposta no sentido de que os mandados de prisão expedidos em virtude de sentença penal condenatória sejam encaminhados diretamente à rede da COESPE e não aos Distritos Policiais. Somente ingressariam nos Distritos Policiais os presos em flagrante delito e ali seriam cumpridos apenas os mandados de prisão preventiva ou provisória.
Organização de prontuário penal padrão que acompanhe o preso sempre que transferido e no qual conste, no mínimo e necessariamente, Folha de Antecedentes, Ficha de Movimentação Carcerária e Atestado de Conduta e Permanência.
Gestões junto aos órgãos competentes para realização de concurso público da Procuradoria Geral do Estado com destinação de vagas em número suficiente para prestação de Assistência Judiciária nas Cadeias Públicas e Varas de Execução Criminal da Capital e Grande São Paulo.
Participação de, pelo menos, um representante da Secretaria de Segurança Pública junto à COESPE para gestão conjunta da distribuição das vagas do Sistema Penitenciário. Estabelecimento de uma ordem criteriosa para preenchimento das vagas.
Atualização e integração dos dados que alimentam o sistema de informática do IIRGD e do Poder Judiciário. A comunicação dos mandados de prisão deve ser agilizada, o que levará, certamente, à agilização das medidas judiciais pertinentes.
Programa de reinserção do ex-detento ao mercado de trabalho como elemento de diminuição da reincidência.
II. Proteção à Testemunha/ Propostas a Nível Federal
Ampliação do Programa de Proteção às Vítimas e Testemunhas, que, muitas vezes, por receio de represálias, deixam de fornecer elementos importantes para a solução de crimes.
Que o Governo Federal encaminhe ao Congresso Nacional, em caráter de urgência, Projeto de Lei que estabeleça a proteção de testemunhas e vítimas em todo o território nacional.
Apoio ao Projeto de Lei nº 565/96, em trâmite perante a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.
Criação de um grupo especializado em proteção à testemunha de atos delituosos graves cometidos por agentes do Estado, vinculado à Ouvidoria da Polícia.
Ampliação da Delegacia Especializada em Proteção à Pessoa de acordo com proposta elaborada pela Diretoria do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa.
Apoio ao projeto de criminalização do porte, tráfico ou depósito ilegal de armas.
Acompanhamento sistemático do Governo Federal, através do Ministério das Comunicações, das concessões de rádio e televisão. Quando as concessionárias veicularem apologia ou incitação ao crime, aplicação imediata da lei penal, com punição dos responsáveis e suspensão da concessão.
Criação, pelo Governo Federal, através do Ministério da Justiça, de Presídios Federais para condenados por crimes hediondos e delitos de competência da Justiça Federal.
Criação de uma Secretaria Nacional de Segurança Pública, vinculada à Presidência da República, dirigida por um civil, com atribuição de formular, coordenar, supervisionar, acompanhar e executar uma Política Nacional de Segurança Pública.
Ampliação do programa de prevenção às drogas e combate ao narcotráfico e ao crime organizado.
III. Polícia Militar
10. Redução do efetivo policial lotado nos serviços administrativos nos quartéis, trânsito, gabinetes, prédios públicos e muralhas de presídios, o que levará à ampliação do policiamento preventivo e ostensivo nas ruas.
PROPOSTAS DE 1997
I.Indenização das Vítimas de Violência Policial
Termo de Cooperação entre a Ouvidoria da Polícia e a Procuradoria Geral do Estado, que permite que a Ouvidoria encaminhe à Procuradoria, através do Grupo de Estudos de Direitos Humanos, para efeitos de indenização civil, os casos em que comprovadamente houve violência policial e que foram acompanhados pela Ouvidoria (Termo assinado em 28.05.98 pelo Procurador Geral do Estado, pelo Secretário da Segurança Pública e pelo Ouvidor da Polícia).
II. Polícia Militar
2. Revisão do Regulamento Disciplinar da Polícia Militar – O Secretário da Segurança Pública solicitou e autorizou que a Ouvidoria da Polícia também elaborasse uma proposta de revisão ampla do atual Regulamento Disciplinar da PMSP, que é datado de 1943, tendo sido elaborado durante o Estado Novo para a então Força Pública de São Paulo, uma espécie de "exército regional paulista". O objetivo da revisão era combinar disciplina e hierarquia com democracia e auto-estima. Os principais pontos da proposta elaborada pela Ouvidoria são:
Fim da pena de "prisão administrativa" por entender ser inconstitucional e caracterizar abuso de autoridade. A punição mais grave para transgressões disciplinares seria a suspensão com reciclagem obrigatória nas Escolas de Formação;
As transgressões consideradas graves são aquelas atentatórias às Instituições ou ao Estado e aos Direitos Humanos Fundamentais;
O Regulamento disciplinar não atinge policiais da reserva;
Eliminação de 40 transgressões que não se coadunam com o Estado Democrático de Direito;
Destaque, em todos os artigos pertinentes, da expressão "ordem legal", a fim de que a legalidade seja sempre o pressuposto da aplicação de ordens na atividade policial, compatibilizando, assim, a hierarquia e disciplina com o Estado de Direito (em 03/07/98 o Governador Mário Covas encaminhou à Assembléia Legislativa projeto de Lei sobre o Regulamento Disciplinar. O projeto sofreu 111 emendas e está em trâmite perante o Legislativo).
III. Propostas comuns às duas Polícias
3. Fundo Estadual de Segurança Pública – A Ouvidoria da Polícia propõe que se estude, a curto prazo, projeto de Lei que institua o Fundo Estadual de Segurança Pública, através de convênios com Municípios, para garantir, fundamentalmente, complemento salarial aos policiais civis e militares e manutenção de equipamentos. Os municípios já contribuem de maneira informal com o setor de Segurança Pública. A institucionalização de um Fundo Estadual dará maior transparência a essa contribuição e propiciará o estabelecimento de um maior vínculo entre a Polícia Estadual e os municípios.
4. Mudança da silhueta de tiro na Academia da Polícia Civil – A Ouvidoria propôs modelo de silhueta de tiro de corpo inteiro, dando maior pontuação para os tiros que atingissem os braços, pernas e ombros, e não as partes letais do corpo. O objetivo da proposta (que foi encaminhada à Ouvidoria pelo Cel PM da Reserva José Silvestre), é criar um conceito de tiro preventivo. A proposta foi encaminhada ao Comando da Polícia Militar, que não aceitou, e ao Delegado Geral de Polícia, que, por intermédio do Diretor da Academia da Polícia Civil, Dr. Tabajara Novazzi, aceitou e já implementou a nova silhueta.
5. Disciplina Permanente de Direitos Humanos na Academia da Polícia Civil – A Ouvidoria propôs a criação de uma disciplina permanente sobre Direitos Humanos na Academia da Polícia Civil. Na gestão do Delegado Geral Dr. Luiz Paulo Braga Braun e do Diretor da Academia Dr. Tabajara Novazzi, a proposta foi colocada em prática. Através de concurso público, foram selecionados 10 novos professores para os quadros da Academia, com a função de ministrar a disciplina para todas as carreiras da Polícia Civil. Foi o primeiro concurso público interdisciplinar feito pela Academia e, dos professores aprovados, cinco não fazem parte do efetivo da Polícia.
AÇÃO PROPOSITIVA – 1998
I. Polícia Civil
1. Diminuir o número de Departamentos da Polícia Civil, extinguindo DEPATRI (Departamento de Investigação sobre Crimes Contra o Patrimônio, que passaria a ser uma Divisão do DECAP) e do DADG (Departamento de Administração da Delegacia Geral), bem como do GOE (Grupo de Operações Especiais) e do GARRA (Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos), que atuam mais como polícia preventiva e ostensiva do que como polícia investigativa e judiciária. Ampliar a atuação do DHPP (Departamento de Homicídios e proteção à Pessoa) e do DENARC (Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos) para a Grande São Paulo e Interior.
2. Fortalecer, dar competência estadual e estudar a possibilidade de criação de carreira própria para o órgão corregedor da Polícia Civil, garantindo, assim, inamovibilidade do pessoal lotado na Corregedoria.
3. Descaraterizar 80% das viaturas da Polícia Civil e fortalecer a investigação científica.
4. Estabelecer um Programa de Assistência Social nos Distritos e Cadeias Públicas, feito por profissionais não pertencentes à Polícia.
5. Reformular a Lei Orgânica da Polícia Civil, criando um regulamento disciplinar mais ágil e fortalecer a hierarquia policial.
6. Propor projeto de Lei ao Congresso Nacional que extingüa a aposentadoria compulsória aos 70 anos para Delegados de Classe Especial, com objetivo de oxigenar a Instituição Policial. A aposentadoria compulsória possibilita que a cúpula da Polícia não se altere por décadas. Proposta de um novo plano de carreira, com 35 anos de serviço e 7 anos, no máximo, no último posto.
II. Polícia Militar
7. Separar o Corpo de Bombeiros da Polícia Militar e considerá-lo como Defesa Civil.
8. Reestruturar a organização da Polícia Militar, criando postos policiais nos bairros onde a criminalidade é alta.
9. Não utilização de armas de fogo em operações em reintegrações de posse, estádios de futebol, greves e outros eventos com multidões.
10. Diminuir o número de patentes da Polícia Militar (hoje são doze: Soldado, Cabo, 1º, 2º e 3º Sargentos, subTenente, 1º e 2º Tenentes, Capitão, Major, Tenente Coronel e Coronel) para , no máximo, seis patentes (Soldado, sargento, Tenente, Capitão, Major e Coronel) e novo plano de carreira, para garantir maior eficiência e diminuir a distância entre oficiais e praças.
11. Reformar o Programa que afasta por seis meses policiais envolvidos em ocorrências com mortes de civis, apressar a investigação dos casos e manter a mesma escala do policial quando ele estiver no PROAR.
12. Implementar o Programa de Saúde Mental da PM, com grupos de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais nos Batalhões, de acordo com projeto de Lei já sancionado pelo Governador.
13. Fortalecer e estudar a possibilidade de criação de carreira própria para a Corregedoria da Polícia Militar.
III. Propostas Comuns às Duas Polícias
14. Criação de um único órgão de informação e inteligência, sob controle do Executivo e com Regimento Interno único, voltado exclusivamente para o combate ao crime organizado e para prevenir e inibir a prática de delitos cometidos por agentes do Estado e subsidiar o planejamento estratégico da ação policial.
15. Criar mecanismos ágeis que garantam rapidez no julgamento de Processos Administrativos, Processos Disciplinares Sumários, Conselho de Disciplina ou de Justificação, de policiais que cometeram delitos e que impeçam que os mesmos, no curso do procedimento, exerçam funções de polícia.
16. Garantir que todo policial em atividade de rua tenha um colete leve à prova de bala.
17. Buscar alternativas, como pagamento de horas-extras, para evitar os bicos dos policiais - cerca de 70% das mortes de policiais militares (homicídios) ocorrem nas folgas.
18. Investigar e reprimir a prática de policiais serem donos diretos ou indiretos de empresas de segurança privada, que "concorrem" com o Estado e não querem a melhoria da Segurança Pública.
19. Unificar progressivamente as Academias e Escolas de Formação e estabelecer convênios com as Universidades para formação do pessoal policial.
20. Priorizar o combate aos homicídios dolosos com policiamento investigativo e preventivo – ostensivo permanente nas periferias da Capital, Grande São Paulo e Interior, e repressão sistemática aos grupos de extermínio.